Macaé Globalizada ou Recolonizada?

Antonio Carlos Silva Santos
Bacharelando em Comunicação Social
Faculdade Salesiana Maria Auxiliadora

Resumo

Este é o primeiro de uma série de artigos que pretendemos escrever, nos quais tentaremos analisar, com equilíbrio e imparcialidade, o processo irreversível da globalização a que estamos submetidos e do qual Macaé seja talvez um dos maiores expoentes do País. Tentaremos analisar também os os benefícios, as consequências, mazelas e contrastes de um sistema que acreditamos não seja novo e sim mais uma etapa de uma antiga tendência humana.

Palavras-chave: Globalização, Recolonização, Macaé

 

ABSTRACT

This is the first one of an article series that we intent to write, in witch we will try to analyze with balance and impartiality, the irreversible process of globalization the one that we are submitted and of the which Macae is perhaps one of the illustrations representative greater of the Country. The benefits, the consequences, illness and contrasts of a system that we believe it aren’t new and yes one more of an old trend human being.

Key Words: Globalization, Re-colonization, Macae

 

Debruçando-nos com um rápido olhar sobre a história da humanidade, podemos observar que esta se deu principalmente pelo processo de conquista, colonização e independência. A repetição constante deste círculo deixa-nos perceber que o homem possui, nos seus genes, o desejo ardente de dominar e este foi apenas um dos caminhos. Nas idades antiga e média a arma de dominação de uns povos sobre os outros, foram o poder da força, a capacidade estratégica e principalmente o nível de conhecimento que determinavam os vencedores e vencidos, os que se submeteriam e os senhores, os que designavam quais as culturas destinadas ao desaparecimento e quais as que sobre estas se sobrepujariam.

Na idade moderna e contemporânea, as armas se modificaram, evoluíram, tornaram-se mais sofisticadas. O poder da força, típica das nações antigas e ultrapassadas cedeu lugar ao poder da riqueza, medida por três fatores: capacidade de produzir bens materiais, qualidade de vida de seu povo e poder de influência sobre outras nações. Neste último, a idéia central é que esta influência tenha retorno econômico ou de prestígio diante do mundo, é o que realmente importa.

A partir do século XIX, com a invenção dos motores que funcionam com combustão interna e da utilização da gasolina como combustível e principalmente com a expansão que este fato gerou na atividade do transporte humano (tanto pela terra, quanto por mar e posteriormente pelo ar) e dos motores industriais, desencadeou-se então uma verdadeira corrida em direção à busca do petróleo (recurso mineral originário da mistura de hidrocarbonetos) existente na profundidade do subsolo e que passaria a sustentar o desenvolvimento industrial de toda a humanidade, passando a ser chamado pela sua utilidade, de "ouro negro", enriquecendo nações ou destruindo-as em questão apenas de horas, construindo em minutos fabulosas fortunas ou vaporizando-as na mesma velocidade.

Nas décadas de 20 e 30 quando o Brasil tentava desesperadamente e com base na crença cega de alguns dos seus filhos, como Monteiro Lobato, descobrir o petróleo em seu subsolo, diminuindo a dependência de sua importação, os diversos mapeamentos existentes no mundo contemporâneo, principalmente dos americanos, afirmavam que não havia possibilidades de sucesso e durante muitos anos esta luta perdurou até que no ano de 1936, em Alagoas, no Poço S. João do Riacho Doce, com apenas 250 metros perfurados, jorrou o primeiro jato de gás de petróleo em nosso país, iniciando assim uma típica corrida do ouro, que já teve seu epicentro localizado em algumas cidades e em todas elas influenciou definitivamente a maneira de viver presente e futura.

Na etapa seguinte, a região hoje conhecida como nordestina, que durante séculos foi abandonada à própria sorte, desprotegida pela natureza e explorada politicamente pelos senhores feudais, tem no Estado da Bahia o centro das atividades extrativas do petróleo, exigindo a logística operacional que as cidades situadas no recôncavo baiano, mais exatamente Catú e São Sebastião do Passé, se tornem o destino de diversos tipos de empresas e profissionais, mas, numa época em que as economias dos países eram fechadas em modelos nacionais, período em que a cooperação internacional era entendida como transferência de tecnologia avançada, onerosa, e em troca da qual, o resultado do nosso esforço era quase todo esvaído sob a forma de pagamento de serviços e aquisição de equipamentos já obsoletos para os seus criadores mas perfeitamente aproveitáveis para nós, tupininquins.

Façamos agora uma rápida viagem, deslocando-nos no tempo e no espaço: por questões menos técnicas que políticas. A Petrobras, (empresa brasileira de economia mista, criada pelo Estado para controlar o monopólio da extração de petróleo) inicia suas pesquisas no litoral norte do Rio de Janeiro, mais exatamente no espaço denominado Bacia de Campos. Estamos então no final da década de 70 e início da década de 80, e como resultado destas pesquisas, grandes mananciais de petróleo são encontrados, tomando rapidamente sobre si a responsabilidade de suprir 82% da necessidade nacional. Inicia-se então uma nova "corrida do ouro" a exemplo do velho oeste americano, em direção a pequena Cidade de Macaé, município que teve sua fundação no Brasil império por estar no caminho da família real e da nobreza que trafegava entre Campos e o Rio de Janeiro, até então baseando sua economia na pesca, na pequena agricultura e nas tímidas iniciativas turísticas.

Surge na década seguinte, da mente dos economistas internacionais, a teoria da "Globalização Econômica" cujo nome é muito mais belo e atraente que seus resultados "transformadores". Está preparado então o cenário que queremos analisar como se tivéssemos isolado um planeta, aplicado uma teoria, observado os resultados e finalmente colhermos as conclusões.

 

"Costuma-se dizer que estamos em uma era em que a maior parte da vida social é determinada por processos globais, em que culturas, economias e fronteiras nacionais estão se dissolvendo. A noção de um processo de globalização econômica rápida e recente é fundamental para essa percepção"

 

Quando lemos este fragmento da introdução do livro de Paul Hirst, as nossas mentes seguem uma natural tendência de projetar um nivelamento por igual de todas as regiões, estados e nações inseridas no contexto da globalização e em conseqüência imaginamos um capital sem pátria gerador de riquezas igualmente compartilhadas, uma economia sem barreiras, um globo sem fronteiras, uma miscigenação cultural e racial sem discriminações, livres para se conservarem intocadas ou mesclarem-se no enriquecimento que vem da permuta constante de valores e símbolos. E neste ponto surge então a questão: este é o modelo de globalização que temos na prática? O que está ocorrendo entre as nações e os blocos por estas formados indica esta direção? Não estaríamos mascarando um processo de recolonização mundial do qual só estariam livres os países que se unissem formando um bloco de resistência a um processo de esvaziamento de seus valores?

 

"De modo geral, cada um dos países do G5/G7 seguiu seu próprio caminho nas questões de política econômica interna, e a divergência de suas filosofias e abordagens básicas têm sido evidentes durante os últimos dez a quinze anos"

 

Durante os últimos 25 anos temos recebido nesta cidade empresas e profissionais de todas as partes do planeta. Aqui geram-se riquezas incalculáveis. A tecnologia que nasce do pioneirismo tem escrito compêndios e tratados de operações para extração do "ouro negro" em águas profundas. Organizações com sede nos Estados Unidos, França, Canadá, Inglaterra, Holanda e África do Sul aqui tem se instalado, operado, adquirido divisas e das formas mais diversas e imaginativas possíveis enviado estas divisas para os seus países de origem. Sob a alegação de transferência de valores à multinacional solidária, proprietária dos equipamentos e da tecnologia aqui empregados, muitas vezes burlando o sistema tributário nacional, entre 50 e 70% do capital aqui gerado é remetido para fora de nossas fronteiras, e o restante não só cobre todas as despesas do investimento na área como ainda permite o reinvestimento numa ciranda permanentemente alimentada.

 

"Mais uma vez o mundo inteiro volta os olhos para Macaé, atraído pelas inovações tecnológicas, produtos e serviços do setor petróleo e gás expostos na segunda versão da Brasil Offshore. Serão 361 expositores de mais de 20 países, divididos em 9.500 metros quadrados de estandes. Mais do que uma vitrine de novidades para a cadeia operacional de exploração de hidrocarbonetos, o evento valoriza o mercado brasileiro, hoje líder internacional na produção de soluções para a busca de óleo em grandes profundidades. Única feira do setor realizada fora dos circuitos das metrópoles brasileiras, a Brasil Offshore subtrai as fronteiras entre Macaé e a cadeia produtiva internacional e entra definitivamente para o calendário mundial de eventos desta categoria"

 

Os olhos de todas as grandes nações se voltam em direção a Macaé, como oportunidade de retorno do capital investido acompanhado de lucros triplicados e qualquer tentativa de legislar limitando esta remessa de divisas enfrentará protestos e estratégias internacionais que estarão alicerçadas não só na nossa, mas na dependência que todos os países do denominado terceiro têm do capital estrangeiro, oriundo dos grandes investidores. Neste ponto surge um impasse: como é possível manter o pessoal neste círculo produtivo, longe das oportunidades dos grandes centros, do acesso a um padrão cultural maior, em suma, da civilização? Torna-se então necessário que se estabeleça aqui um acampamento com condições mais refinadas que possua em torno uma infra-estrutura mínima indispensável ao convívio humano mais requintado, pois do contrário estaremos condenados ao insucesso por falta de mão-de-obra e mesmo o investimento necessário para isto terá seu retorno garantido pela depreciação contábil em poucos anos. Na periferia deste mínimo necessário, mal distribuído e desgastado pela cadeia de corrupção política, do nepotismo e do favoritismo que hoje convivem com as administrações municipais, agregam-se às diferenças socioeconômicas, molas impulsionadoras da violência e do desajuste social e a exemplo das grandes cidades brasileiras e mundiais, convivem a mansão e a favela, lado a lado, na partilha do território e na indiferença cruel que a tudo banaliza.Um dos aspectos mais importantes, intrínseco da globalização deveria ser o da remuneração profissional especializada, considerando-se o custo social de cada nação onde o capital foi investido. O que vemos na realidade não é isto. Este mercado de trabalho é ocupado na sua maioria por estrangeiros originários das nações mães, com salários que comparados ao do profissional nacional que exerce a mesma função parecem obscenos nas suas diferenças.

Neste ponto da nossa análise, perguntam-nos: Isto é globalização ou internacionalização das reservas existentes em nosso subsolo? Entendemos que globalizar seria, respeitando o direito à propriedade material e intelectual, realizando pagamentos justos por estas, manter no pais produtor a maior parte do lucro, distribuindo melhor e como conseqüência promover seu crescimento, enquanto internacionalizar é o que na prática ocorre, remessa de todo lucro para o país de origem dos investidores, permanecendo apenas o suficiente para pagamento das despesas minimizadas ao máximo nos processos de controle de custos, nos quais se baseiam as promoções profissionais.

Para concluirmos este primeiro artigo, retornamos ao título que escolhemos para o mesmo, estamos nos globalizando ou estamos sendo colonizados por uma segunda vez por um sistema mais sofisticado e aprovado aos olhos do capitalismo neoliberal? Por acaso o processo pelo qual passaram todas as nações que antes de sua "independência" foram colônias não foi exatamente igual? Não se retirava destas todas as riquezas disponíveis, pagando apenas o indispensável? A experiência nos ensina que um nacionalismo exacerbado é atitude inútil e suicida, mas que necessitamos de uma política mais compensadora nas assinaturas de nossos contratos internacionais, isto sim, é perfeitamente claro aos nossos olhos e perfeitamente possível de estabelecer. O que falta na nossa história é a consciência política de nação e o que sobra é o sentimento herdado de nossos colonizadores, de retirarmos de toda situação, o maior patrimônio individual que nos seja possível. Temos certeza de que, num futuro não muito próximo, a humanidade chegará a este destino, a globalização não só econômica como social, mas muita mudança de consciência terá que ocorrer antes disto.

 

Referências Bibliográficas

HIRST, Paul. Globalização em questão, Petrópolis: Vozes,1998.

Revista "Macaé Offshore" Edição comemorativa, 2º ano – Uma publicação da Petrobras

BRENER, Jayme. A Globalização e o Brasil – A 3ª Revolução Industrial – Artigo – Publicado no Clube Mundo em 26/05/2003.