O Lugar onde repousam os sonhos

Joice de Araújo Reis
Graduanda do curso de Comunicação Social
Faculdade Salesiana Maria Auxiliadora
Integrante do grupo de teatro sacro João Paulo II

Resumo

Este artigo busca recuperar as histórias e lendas de São Pedro da Aldeia.

Palavras-chave: São Pedro da Aldeia, histórias e lendas.

 

Abstract

This article searchs to recoup histories and legends of São Pedro da Aldeia.

Key Words: Culture, Macaé, cultural politic.

 

“As tuas praias, os teus sertões, a placidez do teu mar, teu sol ardente, noite de lua, noites que fazem lembrar...” Este trecho de “Cidade do Amor” escrita pelo poeta aldeense Vitorino Carriço traduz de forma sutil as belezas e encantos desta cidade que guarda histórias e lendas de um povo simples e feliz.

Fundada em 1617 pelos padres da Companhia de Jesus, São Pedro da Aldeia carrega até hoje a influência da religião na maioria de suas manifestações culturais. Encaixando-se bem no conceito de Clyde Kluckhohn que define cultura como “a vida total de um povo, a herança social que o indivíduo adquire de seu grupo”, a cidade mantém viva em seus monumentos históricos e artísticos as tradições herdadas de suas raízes.

Sendo o município secular, preserva importantes patrimônios como a Igreja Matriz, cuja fundação está intimamente relacionada à da cidade. A construção feita em pedra, cal e óleo de baleia, conforme costume da época, comporta, além da sacristia e da secretaria, um convento, antiga moradia dos jesuítas e um tricentenário cemitério onde eram sepultados religiosos e pessoas gradas do município.

Caminhando pelas ruas da cidade revivemos a história do nosso país através da arquitetura antiga, como a encontrada na Casa dos Azulejos, que originalmente era a residência de uma ilustre família local, servindo certa vez de hospedagem para príncipes imperiais que visitavam a região. Atualmente não é permitida a visita ao seu interior, restringindo a admiração apenas a sua fachada revestida de belos azulejos.

A praça central da cidade ainda conta com a exposição de um canhão do século XVI que, instalado na Aldeia de São Pedro pela ordem do capitão-mor de Cabo Frio, Estevan Gomes, tinha a função de sinalizar ao forte de São Mateus a aproximação de invasores.

Muito procurada também pela beleza de suas praias, a cidade, banhada pela lagoa de Araruama, esconde trechos da história de um Brasil ainda não revelado. Na região existem diversos sambaquis,(sítios arqueológicos) muitos deles ainda não explorados turisticamente, mas que confirmam a presença primitiva dos índios Tupinambás.   Outras atrações são áreas de preservação ambiental como a serra de Sapeatiba, rica em flora e fauna e cujo potencial é enorme para prática de esportes de aventura.

São Pedro guarda em suas memórias sonhos e devaneios de filhos da terra e apaixonados por ela que, inspirados por esse “jardim a beira mar”, decidiram construir neste recanto suas vidas e materializar aqui suas fantasias. Como o acontecido com Gabriel Joaquim dos Santos, negro e filho de uma índia com um ex-escravo africano. Seu Gabriel como era conhecido começou a construir nesta aldeia em 1912 uma pequena casinha, com o intuito de seguir o que acreditava ser o seu destino: viver sempre sozinho.

A obra-prima deste homem simples e despossuído de bens materiais, que nunca teve acesso à escola, aos meios de comunicação ou a qualquer expressão da arte erudita (contando apenas com a admiração das igrejas e conventos antigos da região) demonstra a magnitude de uma arquitetura espontânea e despretensiosa.

Trabalhador das salinas e roças próximas, o artista foi erguendo este sonho que não parou com a finalização da obra, ele queria mais: era preciso enfeitá-la.
A partir de então, utilizando cacos de garrafa, pratos, xícaras, ladrilhos, pedras, conchas, ossos, lâmpadas, tampas de metal e outros objetos, o operário foi dando forma a seus sentimentos, criando enfeites diversos como flores, folhas, mosaicos, luminárias e esculturas fantásticas que iam surgindo através de “visões” sem obedecer a um projeto pré-definido.

Com muita criatividade, imaginação e desprovido de preconceitos quanto aos materiais utilizados, o criador seguia improvisando, preenchendo todos os espaços vazios da Casa da Flor, (nome dado pelo próprio artista) até sua morte em 1985 quando com 93 anos de idade e praticamente cego o aldeense deixava na história seu exemplo de coragem e determinação.

Reconhecida pela sua beleza e comparada as obras de Antoni Gaudi, célebre arquiteto catalão, a Casa da Flor foi tombada incorporando-se ao patrimônio histórico e cultural do município tornando-se um traço marcante da arte popular da cidade, sendo definida com maestria pelo próprio construtor: ‘Tudo caquinho transformado em beleza”.

Atualmente o Instituto Cultural Casa da Flor, uma organização não governamental responsável pela divulgação e preservação do monumento, trabalha em conjunto com a prefeitura na manutenção da obra considerada por artistas, intelectuais e arquitetos de renome no país um bem cultural da mais alta relevância.

Histórias como essa marcam a memória da cidade, assim como as festas religiosas que povoam a maior parte do calendário cultural. Destacando-se por ser a mais tradicional do município a festa de São Pedro, padroeiro dos pescadores, realiza-se no mês de junho ainda guardando algumas tradições.As comemorações iniciam-se na véspera do dia do santo com a Procissão do mastro onde os devotos caminham pelas imediações do município revezando no transporte do símbolo.Na data da festa a cidade é despertada com a  alvorada festiva que anuncia a proximidade da celebração da missa solene.Na parte da tarde ocorre a procissão marítima onde as embarcações partem de uma das belas praias da aldeia, transportando a imagem do santo padroeiro ao som de cantos religiosos e fogos de artifício, até a praia de São Pedro onde são ancoradas e o cortejo dos paroquianos segue a pé até a Igreja Matriz.Carregada de simbolismo a celebração se tornou marco no calendário regional atraindo fiéis de toda parte.

Outra celebração tradicional que se repete todos os anos nas ruas da cidade é a procissão de Corpus Christi (tradição trazida ao Brasil pelos imigrantes portugueses) que se caracteriza pela confecção de tapetes de sal com várias tonalidades que formam desenhos nas ruas próximas a Igreja Matriz.Centenas de aldeenses entre jovens, adultos e crianças se encarregam da ornamentação que é desfeita quando a procissão percorre as ruas previamente enfeitadas.

Tendo alcançado nos últimos anos uma posição de destaque em uma mostra de tapetes de sal promovida pela TurisRio em Copacabana, o município, através das obras do artista plástico Flávio Rangel, conquistou o hexacampeonato tornando-se sinônimo de tradição nesta forma de expressão cultural.

Mais recentemente a cidade tem incorporado a suas manifestações religiosas a encenação da Paixão de Cristo que apresentada ao ar livre conta com a participação de mais de 60 atores que representam as cenas da vida, morte e ressurreição de Jesus atraindo milhares de pessoas entre moradores e turistas.
Mesmo quando tratamos de manifestações populares como o carnaval, São Pedro da Aldeia guarda resquícios de um passado recente marcado pelos blocos populares que assaltando de alegria as ruas da cidade, transformam essa festa em uma lembrança daqueles carnavais onde os foliões ainda vestiam fantasias e pulavam nos bailes de salão ou nas próprias avenidas.

Nesse constante processo de preservação e aquisição de aspectos culturais pode-se perceber nos últimos anos a iniciativa da prefeitura local em promover eventos nesse sentido, além de buscar oferecer infra-estrutura para os já existentes.Projetos como o “Hoje é na praça” buscam divulgar a música popular além de procurar devolver aos aldeenses o gosto pelos encontros prosaicos dos finais de semana, onde se reuniam para dançar e se divertiam embalados pela brisa litorânea desta região também conhecida como Costa do Sol. Atrelado a isso, shows, eventos esportivos, exposições, apresentações, encontros das mais diversas modalidades e festivais - como o já realizado há nove edições no bairro da Baleia, onde milhares de turistas prestigiam o evento, atraídos pela boa música e comida regional, caracterizada principalmente por pratos a base de peixes - buscam incrementar a bagagem cultural do lugar.

Também objetivando divulgar a arte local, os artesãos aldeenses contam com um espaço próprio para exposição de seus trabalhos: A casa dos Artesãos não só expõe as peças dos membros da Associação como também promove a comercialização das mesmas que são confeccionadas com as mais diversas técnicas.Além disso são oferecidos no local cursos de artesanato para própria população.

Enfim, com o progresso e o desenvolvimento, os lugares parecem acabar perdendo certas peculiaridades regionais deixando restrito ao passado seus costumes e tradições.Porém, São Pedro da Aldeia parece preservada em meio a tanta descaracterização.

Os moradores mais antigos do local contam a lenda de que certo dia um padre que era pároco da cidade, aborrecido com a perseguição de um grupo de fiéis da elite aldeense, teria deixado o lugar rogando uma praga, afirmando que este nunca iria “para frente”.

Hoje podemos dizer que em parte essa profecia não se cumpriu pois a cidade evoluiu em muitos aspectos, mais seja graças a ela ou não, a aldeia de São Pedro ainda guarda muito de seu passado que convivendo harmonicamente com o presente e aguardando sem pressa a chegada do futuro, abriga a história de muitos filhos que escolheram essa terra para repousarem seus sonhos.

“E assim levo a minha vida assim nos sonhos, sonho toda noite.Eu durmo tarde da noite, mas quando vou dormir assim mesmo vêm os sonhos.Vêm aqueles sonhos, aquela visão, aquele pensamento...” Gabriel Joaquim dos Santos.

ReferÊncias BibliogrÁficas

PEDROSA, Rodolfo.Informações básicas São Pedro da Aldeia.1° edição.Administração 93/96.
ZALUAR, Amélia.Uma arquitetura poética.Disponível em:http://www.casadaflor.org.br/hist.htm .Acesso em 20/06/06.
ZALUAR, Amélia. A forma poética do discurso de Gabriel Joaquim dos Santos.Disponível em:http://www.casadaflor.org.br/gabriel.htm .Acesso em 20/06/06.
COMUNICAÇÃO, Subsecretaria de. Festas populares e atrações.Disponível em: http://www.pmspa.rj.gov.br/turismo06.aspx. Acesso em 20/06/06.
COMUNICAÇÃO, Subsecretaria de.Canhão do século XVI .Disponível em: http://www.pmspa.rj.gov.br/turismo04.aspx. Acesso em 20/06/06
.

 

Revista Eletrônica Minhoca da Terra #2
Curso de Comunicação Social - Publicidade e Propaganda
Faculdade Salesiana Maria Auxilidora - FSMA / Macaé-RJ
www.fsma.edu.br/publicidade/minhoca